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Investimentos em biotecnologia: tendências para observar de perto
07/07/2021

Investimentos em biotecnologia: tendências para observar de perto
07/07/2021

Por Lucas Mayrink Assis

 

Descubra neste artigo quais são as principais tendências no setor de Biotecnologia e como fazer a prospecção ativa dos melhores projetos

 

O mercado de investimentos em startups e empresas está cada vez mais aquecido, com o ano de 2020 demonstrando um franco crescimento e 2021 compartilhando das mesmas expectativas. Assim, a prospecção ativa e direcionada é uma característica primordial para o sucesso dos investimentos. Prospectar os melhores negócios no momento certo se torna crucial para a competitividade em alto nível no universo do investidor. Dessa maneira, surge a necessidade da identificação das tendências tecnológicas mais promissoras para os próximos anos, isto é, aquelas com maior potencialidade de atração de investimentos adicionais e que possivelmente gerarão maior lucratividade a longo prazo. Neste contexto, esse artigo visa cobrir algumas das mais promissoras áreas para investimentos em biotecnologia aplicada à saúde, enfatizando-se suas potencialidades técnicas e abrangências mercadológicas.

1) Vacinas de mRNA

Vacinas de mRNA se tornaram uma importante alternativa às plataformas vacinais comumente utilizadas e vêm se mostrando consideravelmente eficazes na prevenção da COVID-19 em conta de sua alta eficiência, rápida manufatura e baixos níveis de efeitos colaterais. Em termos biológicos, as melhoras tecnológicas nas vacinas de mRNA incrementaram pontos fundamentais do seu mecanismo de ação, como o aumento da síntese de proteínas de interesse, modulação da imunogenicidade, além da própria estabilização química da molécula de RNA propriamente dita. Essas vacinas se mostraram potencialmente eficazes contra diversas patologias, como em experimentos usando modelos animais com Influenza e Zika vírus, além da COVID-19. Abordagens oncológicas também são promissoras, incluindo dendritic cell vacines e mRNAs injetáveis. À medida que os mecanismos de ação bioquímica das vacinas de mRNA forem desvendados e a estabilização físico-química da molécula for otimizada, espera-se uma ampliação considerável da abrangência coberta por esse tipo de terapia, com enormes potenciais mercadológicos. O mercado de vacinas de mRNA, em 2021, é estimado em $ 32 bilhões, podendo chegar a valores estratosféricos dependendo da necessidade de vacinas e da ampliação de sua utilização para outras patologias diferentes da COVID-19.

2) Nanopartículas lipídicas (LNPs) 

O sucesso das vacinas de mRNA é fortemente dependente da estabilização das moléculas de mRNA propriamente ditas. As moléculas de mRNA, de uma maneira geral, são quimicamente instáveis e bastante propensas à degradação enzimática. A fim de contornar esses obstáculos e garantir a ação imunológica das vacinas, as moléculas de mRNA são complexadas a LNPs, as quais podem conter lipídeos ionizáveis cujas cargas positivas se ligam ao esqueleto negativo do mRNA, lipídeos peguilados, fosfolipídeos e colesterol. O desenvolvimento de LNPs é um grande desafio experimental e muito ceticismo foi gerado em torno do sucesso da tecnologia quando associada a mRNAs. Atualmente, a manufatura consistente de LNPs e a obtenção de matéria-prima qualificada são obstáculos ao escalonamento da produção de vacinas de mRNA. Adicionalmente, a engenharia bioquímica de novas LNPs tem grande potencial de aumentar a abrangência dessas vacinas, assim como potencializar novas formas de entrega controlada de fármacos em outros contextos da medicina. A abrangência mercadológica desse tipo de tecnologia é tão significativa quanto a das vacinas de mRNA, sendo que ela também pode ser utilizada em mecanismos de entrega controlada de substâncias não correlacionados com vacinas. Em 2019, antes da pandemia, o mercado global de nanofarmacêuticos de origem lipídica era de cerca de $ 47 bilhões, com estimativas de crescimento para 2021 apontando para 57 %, a partir desse valor. Frente ao advento das vacinas de mRNA, essa porcentagem, sem sombra de dúvidas, é consideravelmente maior do que a estimativa inicial e as tecnologias, por consequência, mostram-se ainda mais promissoras, levando-se em conta a lucratividade associada.

3) Novas alternativas para o tratamento de infecções causadas por superbactérias

O uso indiscriminado de antibióticos na medicina humana e veterinária levou à seleção de cepas resistentes a essas drogas, tornando, consequentemente, o tratamento dessas infecções um desafio e aumentando-se a letalidade associada. Diversas bactérias já são um problema real nesse contexto, por exemplo, Staphylococcus aureus e Neisseria gonorrhoeae, entre outras. O custo e o tempo necessário para o desenvolvimento de novos antibióticos os tornam menos atrativos do ponto de vista de retorno financeiro e, muitas vezes, essas drogas ficam de fora das prioridades mercadológicas da indústria farmacêutica. Assim, surge um novo rol de terapias alternativas que visam diminuir os mecanismos de virulência das bactérias, dessa maneira restaurando a eficácia de antibióticos antes ineficazes frente aos mecanismos de escape desenvolvidos pelos patógenos resistentes e, adicionalmente, aumentando a eficiência da resposta imune do hospedeiro. Quimicamente, essas moléculas pertencem a diferentes classes, como: depsipeptides, TarG inhibitors, peptídeos cíclicos, alcaloides, polifenóis, FabI inhibitors, ciclodextrinas etc. Além disso, é de relevância citar a fagoterapia, principalmente no contexto de combate a biofilmes, um problema real no que tange a mecanismos de resistência. Dentre os novos alvos moleculares que contribuem para a diminuição da virulência bacteriana, encontram-se o controle de mecanismos biológicos do tipo quorum-sensing, inativação de bombas de efluxo, repressão da biossíntese de lipídeos, repressão da síntese de toxinas, entre outros. O mercado para esse tipo de novas substâncias é de grande potencial e será crescente nos próximos anos frente ao agravamento da resistência bacteriana e de seu impacto na qualidade de vida da sociedade.  

4) CRISPR Therapies

Com origem em mecanismos de defesa bacterianos, o sistema CRISPR (Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats) habilita a edição gênica por meio da clivagem enzimática do DNA. Tecnologias baseadas na técnica de CRISPR emergiram como robustas ferramentas de edição gênica, com aplicações em diferentes campos da biotecnologia e permitindo a manipulação genética de diversos organismos, incluindo seres humanos, plantas e micro-organismos. Adicionalmente, a descoberta e o desenvolvimento de outros sistemas de CRISPR otimizaram a abrangência da edição gênica de maneira considerável. Nesse contexto, sistemas do tipo CRISPR/Cas9 têm o potencial de revolucionar a indústria da saúde, tratando-se de tecnologias altamente disruptivas e de grande valor agregado. Por exemplo, a tecnologia CRISPR possui grande aplicabilidade na oncologia e no tratamento de doenças genéticas. Em 2019, teve início nos Estados Unidos os primeiros testes de uma terapia de combate ao câncer utilizando a tecnologia CRISPR. Essa terapia envolve modificações genéticas em células T, de modo a torná-las aptas a reconhecerem e promoverem a destruição de tumores. Em termos de mercado, por exemplo, a empresa CRISPR Technologies, a qual possui um teste clínico em desenvolvimento nos EUA utilizando o sistema CRISPR, tem valor estimado de cerca de $ 11 bilhões. Entretanto, questões éticas e o acompanhamento dos pacientes a longo prazo ainda são consideráveis desafios a serem vencidos para que a tecnologia se estabeleça solidamente como uma alternativa terapêutica viável e abrangente.

5) Spatially resolved transcriptomics

Análises de transcriptomas permitem a avaliação da expressão gênica de proteínas-chave para o funcionamento bioquímico do organismo. De um modo geral, essas análises fornecem um valor médio da expressão de um gene de interesse nas células contidas em um determinado tecido que foi analisado. Logo, o resultado dessa análise contempla todas as células contidas no tecido e não células individualizadas. Nesse contexto, quando a técnica de single-cell RNA sequencing (scRNA-seq) se difundiu, uma nova camada de acurácia foi adicionada à análise de transcriptomas, uma vez que o scRNA-seq permite que a expressão gênica seja analisada em tipos celulares individualizados. Contudo, uma vez que as células analisadas são extraídas de tecidos por meio de técnicas físico-químicas e/ou enzimáticas, a influência bioquímica de sua localização espacial precisa no tecido, assim como da comunicação com as células vizinhas, é perdida na análise realizada. Diversas companhias de biotecnologia atualmente desenvolvem tecnologias que permitem analisar transcriptomas sem a perda dessas informações supracitadas, em um tipo de análise denominada de “spatially resolved transcriptomics”. Dessa maneira, faz-se possível o estudo da expressão gênica de milhares de genes em diferentes células em seus locais de origem, levando-se em consideração a influência da comunicação entre células vizinhas e da homeostase do tecido em questão. As perspectivas para esses tipos de tecnologias são promissoras, sendo as mesmas disruptivas e com a capacidade de levar o entendimento do funcionamento celular e do metabolismo de doenças e infecções a um patamar nunca visto até então, dessa maneira permitindo o surgimento de um novo rol de terapias.

No contexto supracitado, verifica-se que há tendências tecnológicas fortemente impulsionadas por como a pandemia direcionou e alterou as perspectivas dos sistemas de pesquisa e inovação, acelerando e capitaneando negócios, tanto no que tange ao fomento privado quanto no que tange ao fomento de caráter público. A rápida necessidade de desenvolvimento de vacinas contra a COVID-19 solidificou novos horizontes de pesquisa, como as vacinas de mRNA, as quais devem, a longo prazo, terem seu escopo ampliado a fim de abarcar novas patologias. Similarmente, o mercado de nanopartículas lipídicas, que já estava aquecido no contexto de drug delivery, agora toma um novo panorama em consonância com o desenvolvimento das vacinas de mRNA. Essas tecnologias se somam a vertentes que já estavam aquecidas mesmo antes da pandemia, como o combate a superbactérias resistentes e as técnicas de edição gênica (CRISPR). Finalmente, a necessidade do entendimento mais acurado da influência da sinalização celular em processos bioquímicos faz com que técnicas que analisem a expressão gênica sem desvincular as células de seu meio original sejam altamente promissoras (spatially resolved transcriptomics), dessa maneira tendo potencial de levar o entendimento de doenças e o desenvolvimento de novas terapias a um patamar nunca antes alcançado.

 

Sobre o autor

Lucas Mayrink Assis é Doutor em Genética e Biologia Molecular, com ênfase em microbiologia, pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e Bacharel em Bioquímica pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Possui experiência com trabalhos no Institut de Biologie Structurale (Grenoble – França), no Laboratório Nacional de Biociências (Campinas) e na Virginia Commonwealth University (Richmond – EUA). Atualmente é Agente de Desenvolvimento de Negócios no BiotechTown.

 

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